na Douda Correria

 Em dois sítios vi quadros do pintor Mark Rothko

 Foram sempre pinturas com duas ou
 três grandes manchas quadradas de
 cor ocupando todo o espaço da tela

 Em São Francisco vi o No. 14 no topo a
 vida do laranja vai-se enxaguando pelas
 bordas no castanho incolor do fundo e na
 parte abaixo um acompanhante azul soturno
 celebra a pesada gravidade do quadro

 Em Londres vi nove mais lúgubres
 Seriam para um restaurante nova-iorquino
 não fossem os tons tão pesados
 o pouco contraste das camadas

 Não sei de arte nem de mim para saber
 porque gosto dos quadros do Mark Rothko

 Há outros em que sei olhando as formas
 desenhadas há o desenlace está algo para
 ler e saber algures entre a moldura e depois
 decido mas estes são poemas muito crípticos
 o desafio que devia derrotar a minha literacia
 e que talvez o faça estando eu no chão com
 a náusea da ignorância olho para a parede e
 rio-me muito enternecido muito agradecido
 o laranja sobre o azul mais escuro o que será
 o que ainda poderá ser porque nunca foi
 nada e nunca ninguém o soube mesmo

 Disseram que o pintor Mark Rothko era um
 expressionista abstracto e que ele rejeitara
 a classificação eu acho que estava assustado